"Safe Place" - à beira da tragédia

A primeira cena de "Safe Place", longa metragem do realizador croata Juraj Lerotic, marca o tom para o resto do filme – Um plano afastado mostra-nos um bloco de apartamentos diante do qual brincam crianças, um bairro onde há gente que entra e sai, uma cena cuja banalidade é interrompida por um homem que corre em desespero para conseguir entrar no bloco de apartamentos e evitar que o seu irmão se suicide.

Lerotic conduz o filme vencedor do IndieLisboa 2023 através deste ambiente de pequenas disrupções do bucolismo quotidiano aplicando o contraste com a inquietação do ciclo familiar no qual se atravessa um drama desta dimensão. E fá-lo sem procurar respostas, nem para as causas do comportamento suicida de Damir, nem procurando desenhar um manual de boas práticas sobre como lidar com esta situação no seio familiar.

Na verdade, Bruno, o irmão, e a mãe, na tentativa de procurarem o maior conforto para Damir, incorrem numa série de actos desesperados que seriam seguramente desaconselhados por quem tivesse o mínimo de distância emocional, agindo, de resto, à revelia das instituições e da autoridade.

Mais do que no estado depressivo de Damir, o filme aponta o foco ao desconcerto da família, que vive num misto de pânico contido e urgência de agir, de tentar chegar a Damir e resgatá-lo da sombra letárgica em que vive.

Embora tendo este gravitas emocional em comum, também é verdade que mãe e irmão lidam com a situação de forma diferente e esse ângulo é explorado de forma bastante hábil, especialmente no caso da mãe, em que a fragilidade do filho, já adulto, faz regredir a relação maternal até uma componente quase infantil.

Durante o filme não conseguimos sacudir a ideia de que estamos, na verdade, perante um fantasma, alguém que está ali, mas que se nos escapa. Nesse sentido, Lerotic traz o auditório ao mesmo nível emocional da família, jogando com os domínios da realidade sem romper a continuidade narrativa.

"Safe Place" - o título soa a ironia - nunca nos oferece refúgio e, acima de tudo, não nos permite escapar da ideia de que para chegar ao lugar de paz teremos de aceitar a tragédia.