Publicado em 15 Jul. 2023 às 12:46, por filmSPOT, em Notícias de cinema (Temas: Indústria cinematográfica, Cinema Norte-Americano)
O sindicato dos atores uniu-se à greve dos argumentistas. Ambos lutam por receber mais dinheiro pelo seu trabalho e querem regras que os protejam da inteligência artificial.
A indústria norte-americana do entretenimento parou. Os 160 mil membros do SAG-AFTRA, o sindicato dos atores, iniciaram uma greve a 14 de julho somando-se aos cerca de 11 500 argumentistas em paralisação desde 1 de maio.
Lutam por aumentos nas remunerações mínimas e nos valores remanescentes devidos pela exibição dos seus trabalhos, mas também contra um novo inimigo, a inteligência artificial.
Coube a Fran Drescher, convocar a primeira greve do sindicato em 43 anos após terem falhado as negociações com os mandatários dos estúdios e plataformas de streaming. A presidente do SAG-AFTRA, que representa desde artistas de cinema e televisão, a cantores e bailarinos, qualificou as propostas iniciais da Aliança dos Produtores de Cinema e Televisão como "insultuosas e desrespeitosas".
"Aqui, somos nós as vítimas. Estamos a ser vítimas de uma entidade muito gananciosa", afirmou a estrela da sitcom "The Nanny", acrescentando "Se não nos erguermos agora, vamos estar todos em apuros, vamos estar todos em risco de sermos substituídos por máquinas".
Como efeito prático imediato, toda a produção cinematográfica e televisiva norte-americana será interrompida.
Os membros do sindicato não poderão assistir a estreias, nem dar entrevistas sobre trabalhos já concluídos. De fora estão igualmente as presenças em entregas de prémios, festivais de cinema, ou convenções. Também lhes está vedada a promoção de projectos nas redes sociais enquanto a greve estiver em vigor.
É a segunda greve simultânea de actores e argumentistas. A anterior foi em 1960.
Na última vez que os artistas de cinema e televisão pararam, em 1980, a greve durou um período recorde de 95 dias. Em causa, na altura, estava a participação nas receitas do mercado de vídeo que dava os primeiros passos.
Agora, os obstáculos são outros, o streaming e a inteligência artificial. Parece ser voz comum a muitos grevistas que as plataformas digitais trouxeram remuneração inferior e condições de trabalho precárias. Critica-se a falta de transparência das audiências online e os pagamentos tardios e escassos.
O maior problema situa-se na base da pirâmide, nos que estão distantes do estatuto de estrela e têm menos oportunidades de trabalho. Vários atores entrevistados pelo Variety nos piquetes de greve formados em Los Angeles falam de cheques de poucos dólares, ou mesmo de cêntimos, contratualmente devidos como remanescentes de trabalhos anteriores por cada exibição de um filme, ou de um episódio de uma série televisiva.
Por outro lado, argumentistas e atores enfrentam o que é visto como uma ameaça existencial pela utilização crescente de inteligência artificial (IA). Um dos pontos que separa sindicatos e patrões é precisamente a criação de regras para o uso desta tecnologia, tanto na escrita, como na representação.
O The Hollywood Reporter lembra que a greve a solo dos argumentistas, em 2007, terá custado mais de dois mil milhões de dólares e avisa que a paralisação de 2023 pode ter um impacto financeiro ainda maior.
Os grandes estúdios e os streamers tem estado a baixar custos para reduzir o endividamento que se seguiu ao investimento nas novas plataformas. Após a fusão entre a Warner Bros. e a Discovery, na primavera de 2022, David Zaslav, o CEO da nova empresa, implementou uma estratégia de despedimentos e cortes que foi imitada por outras grandes empresas do setor como a Paramount, ou a Disney.
Antes, a Netflix, que viu o preço das suas acções cair após a primeira quebra forte de quase um milhão de subscritores, também anunciou menos investimento em conteúdos após anos de gastos quase ilimitados.
Um dia antes do início da greve dos atores, o CEO da Disney, Bob Iger avisou que os sindicatos "têm de ser realistas quanto ao ambiente empresarial e ao que este negócio pode oferecer", um sinal de que não há muita vontade de abrir os cordões à bolsa numa altura em que ninguém ainda descobriu como criar rentabilidade nos serviços diretos ao consumidor.
Fran Drescher não gostou. Qualifica de "terrivelmente repugnantes e fora de contexto" as declarações de Iger e considera "evidente que não faz a mínima ideia do que está a acontecer no terreno". Aconselha mesmo a Disney a não o deixar falar sobre o assunto.