"Alcarrás" - a natureza idílica e sombria

Publicado em 14 Jul. 2022 às 18:01, por filmSPOT, em Opinião, Notícias de cinema (Temas: O Espírito da Colmeia, Cinema Europeu)

À segunda longa metragem, Carla Simón confirma-se como uma cineasta sólida, contida, mas eficaz.

Premiado com o Urso de Ouro na última edição do Festival de Berlim, "Alcarrás" acompanha os Solé, uma família de agricultores do interior da Catalunha confrontados com a inevitabilidade de perder as terras que trabalham desde os tempos do pós-Guerra Civil.

Depois de "Verão 1993", Carla Simón leva-nos de volta à Catalunha rural e à evocação da infância, tão fundamental também em "Alcarrás" pela mão do fabuloso elenco infantil, cuja inocência e sentido de liberdade contrasta tão bem com a postura agrilhoada que os adultos mantêm face às adversidades.

De resto, Simón joga muito bem com os contrapontos durante todo o filme, mostrando o lado idílico da natureza, despertando os sentidos através de planos fechados de fruta madura, ou de pomares extensos sob um sol primaveril, evitando, por outro lado, romantizar a vida rural, destapando o seu lado escuro sempre com uma subtileza naturalista, não necessariamente militante - dos monopólios das terras, das praças de jorna montadas no largo da povoação, das provações físicas de trabalhar a terra, constantemente invocadas na figura do pai Quimet.

"Alcarrás" é um filme consciente da força da sua mensagem, que se permite escolher a efemeridade da nostalgia à insipidez do progresso e fá-lo dando espaço às suas personagens, fazendo-as evoluir dentro das dinâmicas familiares que lhes pautam o quotidiano, vivendo as angústias e as esperanças como indivíduos e não apenas como um monólito familiar.

Nesse sentido, todas as personagens têm a sua micronarrativa própria, um passado e uma carga emocional que nos é dada a conhecer quando provocada pelas derivas tirânicas, embora não necessariamente mal intencionadas, de Quimet, o pai.

Ao segundo filme, Carla Simón confirma ser uma autora sólida que, como uma estudiosa do comportamento humano, observa sem intervir, consciente de que para contar um drama não é preciso dramatizar.