Publicado em 16 Jul. 2024 às 23:55, por Pedro Sesinando, em Opinião, Notícias de cinema (Temas: O Espírito da Colmeia)
A primeira longa-metragem do italiano Alain Parroni parte de uma estética ligada aos indies norte-americanos para acompanhar três jovens presos no vazio de um verão em Roma.
Na viragem do século presente, o cinema independente norte-americano ficou marcado por alguns nomes que se dedicaram ao retrato geracional do seu tempo, particularmente a partir do tédio enquanto objeto de estudo, ou de uma espécie de ideia de "tempo suspenso", no qual os jovens viviam à margem da presença dos adultos e das convenções mundanas.
Talvez o nome mais óbvio seja o de Harmony Khorine, cuja presença, pensando em "Gummo", ou no mais recente "Springbreakers", sentimos por toda a parte em "Um Domingo Interminável", a primeira longe metragem do italiano Alain Parroni.
É a partir desta estética indie que Parroni parte, enxertando-a num universo que lhe é mais familiar, o da Roma suburbana, conciliando os elementos da história clássica de coming-of-age com os de um road movie estático, por paradoxal que pareça.
O filme acompanha Brenda, Alex e Kevin, três jovens com menos de 20 anos que habitam na indolência do último estertor da adolescência. Os três formam uma tribo que vive num estado de fim de semana permanente - não necessariamente um domingo –, numa perpétua tentativa de pensar formas de matar o tempo.
Embora disruptivos de uma certa ordem pública convencional, não são violentos, ou particularmente desagradáveis. São miúdos presos na quietude do verão, a experimentar a audácia pela última vez, deambulando entre a Roma eterna e os seus desoladores arredores, enquanto sentem que o ar dos tempos, para eles, está a mudar.
Sobre o seu passado, ou que os juntou na condição de nómadas, não sabemos nada. Na verdade, esta renúncia ao explicativo acaba por ser a maior qualidade do filme e ajuda Parroni a evitar clichés e determinismos para chegar à tarefa de entender o pedaço de geração que está a tentar retratar. Para tal, Parroni socorre-se de outros artifícios, envolvendo o filme num constante histrionismo de luz e movimento, que tem o mérito de não tornar o filme demasiado confortável e colocar-nos no mesmo nível de urgência em que os três amigos vivem.
Esta urgência como resposta ao tédio e ao vazio é a força motriz que carrega boa parte do filme, tornando-se óbvio que o limbo narrativo e visual em que caiu não se consegue sustentar mais.
Por fim, Parroni acaba por ceder às normas e encaminha o filme para um final algo precipitado e, acima de tudo, pouco consistente face aos primeiros actos que, dentro do caos, conferiam ao filme alguma solidez.
Na realidade, o acto final de "Um Domingo Interminável" atraiçoa o que o jovem cineasta romano vinha fazendo até aí de mais interessante, gerindo pessoas reais à volta de um tempo inerte, o que lhe permitiu uma tentativa de reconstrução da linguagem e, implicitamente, uma aproximação à estética realista, que vem da necessidade de abordar uma geração instada a reconstruir as suas próprias formas de comunicação para acomodar o excesso de estímulos a que está sujeita e em cuja ambiguidade cresceu.
Este cuidado de Parroni, em particular ao entregar o discurso direto às personagens, permite que o filme seja algo mais que mais um olhar sobre o tédio. A ideia não chega para salvar "Um Domingo Interminável", mas não deixa de ser reconfortante o suficiente para pensar que Alain Parroni pode ser muito mais que esta primeira obra.
"Um Domingo Interminável" estreia a 18 de julho nos cinemas portugueses.