Cartaz de cinema

O melhor que vimos em 2020 (versão pandemia)

Publicado em 30 Dez. 2020 às 21:20, por filmSPOT, em Notícias de cinema (Temas: Festivais de cinema)

O melhor que vimos em 2020 (versão pandemia)

A Inês Moreira Santos e o Samuel Andrade falam do melhor que viram este ano, em festivais, nas salas de cinema e na televisão.

O ano foi estranho. O mundo recolheu-se em casa, passámos a usar máscaras e a desinfetar as mãos a todo o momento. Os cinemas e os teatros fecharam portas, as produções pararam. Festivais foram cancelados, ou adaptaram-se à novidade. Falou-se muito em "online" e "streaming", quase tudo passou a ser "virtual" e "não presencial". Há outra vez ameaças de que a experiência de ir ao cinema numa sala está para acabar, mas preferimos não acreditar nesses arautos da desgraça.

Com tudo isto em conta, desafiámos dois dos nossos colaboradores mais chegados, a Inês Moreira Santos, que também opina regularmente sobre cinema no blogue "Hoje Vi(vi) um Filme", e o Samuel Andrade, dono da secção "O Síndrome do Vinagre", a construirem um top de final de ano. Mas quisemos dar-lhe um toque especial. Seria um top de qualquer coisa que tivessem visto durante estes 12 meses mais recentes: filmes, séries, ficção, documental, longo, curto, em casa, no cinema, ou em festivais. 

A Inês decidiu construir o seu top5 apenas em redor de títulos que viu em festivais e nós achámos muito bem. O Samuel escolheu quatro filmes e uma série documental exibida numa plataforma de streaming. Não são "os melhores do ano". Apenas duas listas de excelentes obras audiovisuais vistas em 2020, o tal da pandemia...

Os 5 melhores que vimos em 2020 por Inês Moreira Santos

Ao longo deste estranho ano de 2020, foram muitos os festivais de cinema que se reinventaram e aconteceram, contra todas as pandemias e confinamentos, em formato físico, online ou híbrido. Foram também muitas as curtas e longas-metragens com que nos presentearam. Eis cinco dos melhores filmes vistos nos festivais de cinema nacionais ao longo de 2020.

1. Tantas Almas (Valley of Souls), de Nicolás Rincón Gille - FICLO - Festival Internacional de Cinema e Literatura de Olhão 2020

Uma das melhores surpresas cinematográficas vistas em 2020. Tantas Almas, de Nicolás Rincón Gille, é uma homenagem à tragédia que assolou muitas famílias colombianas, devido à violência de forças paramilitares, na zona do Rio Magdalena, onde se passa a ação do filme. O protagonista José parte na sua canoa, numa jornada de resiliência e esperança, para recuperar os corpos dos filhos assassinados.

2. A Nossa Terra, o Nosso Altar, de André Guiomar - Doclisboa 2020

O realizador leva-nos numa viagem ao Bairro do Aleixo, no Porto - entretanto demolido - e entra na intimidade e rotina dos moradores que habitaram as torres ao longo de várias décadas. A Nossa Terra, o Nosso Altar é o registo das memórias, união e desgosto de uma comunidade obrigada a separar-se.

3. 28½, de Adriano Mendes - IndieLisboa 2020

A chegada à vida adulta, o desencanto e o confronto com novas responsabilidades, dilemas e emoções são as propostas da segunda longa-metragem de Adriano Mendes. A maturidade narrativa, pontuada por alguns momentos especialmente marcantes - tão realistas quanto fantasiosos -, revela que o realizador começa a construir um estilo muito próprio, que o distingue no panorama nacional. Aguarda-se a estreia comercial.

4. Mémorable, de Bruno Collet - Monstra 2020 - Festival de Animação de Lisboa

A única curta-metragem deste top 5 é uma animação em stop motion sobre um pintor com Alzheimer. Mémorable é comovente, contado com uma sensibilidade única, e usa a técnica para melhor fazer "ver" as dificuldades sentidas pelo protagonista. Curiosamente, esteve nomeado para Melhor Curta de Animação nos Oscars 2020.

5. Buio (Darkness), de Emanuela Rossi - MOTELx 2020 - Festival Internacional de Cinema Terror de Lisboa

Buio clama emancipação feminina, através de uma história de terror atmosférico pós-apocalíptico. Três filhas vivem reclusas numa casa escura, com o pai, que lhes exige obediência abusiva, e apenas ele tem o direito de sair para a rua, sob extrema protecção. O fervor religioso e o medo do desconhecido limitam a liberdade das três jovens, ameaçadas pelo machismo paterno. Uma surpresa diretamente de Itália para o MOTELx.

 

Os 5 melhores que vimos em 2020 por Samuel Andrade

 

1. Diamante Bruto

Lançado por cá ainda em janeiro, e apenas disponibilizado em streaming pela Netflix (mal sabíamos então que essa realidade iria reger o modo de vermos cinema em 2020…), o quilate deste "Diamante Bruto" não encontrou paralelo em nenhuma outra estreia ao longo do ano. Com Adam Sandler a comprovar ser mesmo ator, o ritmo frenético do filme, um argumento assente no conceito de que quando as coisas estão mal podem correr ainda pior, e um virtuoso trabalho de fotografia e sonoplastia são os ingredientes do (meu) melhor filme do ano.

2. O Farol

Obra puramente sensorial, potenciada pela opção do realizador Robert Eggers de filmar em película a preto e branco, observar "O Farol" quase nos transporta para a experiência do espectador de cinema dos anos 20. Paralelamente a uma história de isolamento, superstição e loucura, encontramos as assombrosas interpretações de Willem Dafoe e Robert Pattinson, seguramente dois dos melhores "character actors" da atualidade.

3. Martin Eden

Entrecruzando filmes históricos com uma belíssima fotografia captada em 16mm, "Martin Eden" baseia-se num romance homónimo de Jack London para narrar não só o percurso de um desiludido escritor de sucesso, como também traça uma visão da Europa ao longo do Século XX, entre guerras mundiais, transformações sociais e antagonismos políticos. Luca Marinelli, o protagonista do filme, foi premiado como melhor ator no Festival de Veneza de 2019.

4. Mosquito

Abordando um período da nossa história (isto é, a participação portuguesa na Primeira Guerra Mundial) raramente destacado no cinema, "Mosquito" é, das estreias de 2020, o melhor filme português do ano. Das imagens mais abstratas até à reflexão em torno do "colonialismo lusitano" em África, o realizador João Nuno Pinto inspirou-se nas vivências do seu avô naquele conflito para construir uma obra técnica e narrativamente impressionante.

5. The Last Dance

Do conteúdo televisivo que nos chegou ao longo de 2020 (e apesar de ainda não ter espreitado muita dessa oferta, sendo "The Mandalorian", ou "Gambito de Dama", os títulos mais sonantes), "The Last Dance" foi a produção para televisão que melhor tive em consideração. Recordando a carreira e o sucesso de Michael Jordan, ao serviço dos Chicago Bulls na década de 1990, a série documental faz, em dez episódios sustentados por imagens inéditas captadas na época, o percurso de uma das equipas mais icónicas do basquetebol norte-americano e, nesse processo, afirma o poder dos materiais de arquivo enquanto fonte de inspiração criativa e divulgação histórica.