Cartaz de cinema

Morreu Alain Delon

Publicado em 18 Ago. 2024 às 10:28, por António Quintas, em Notícias de cinema (Temas: Obituário)

Morreu Alain Delon

A estrela do cinema francês tinha 88 anos.

Alain Delon morreu na madrugada de domingo, aos 88 anos, na sua propriedade em Douchy, revelaram os três filhos do ator francês.

Retirado da vida pública desde que sofreu um AVC em 2019, Delon foi notícia em 2023, quando os filhos expulsaram a mulher que cuidava do pai e se dizia companheira dele, por abusar da fraca condição do ator, que acabou por ser colocado sob tutela forçada em abril de 2024.

Estrela maior do cinema europeu nos anos 60 e 70 do século XX, Delon foi também uma personalidade inquieta, sombria, amarga e atormentada, capaz de opiniões pouco populares, sem se importar com as reações, ou com a imagem que outros construiram dele.

O seu talento, aliado a uma beleza e um carisma incomuns, valeu-lhe o trabalho com os maiores realizadores e o protagonismo em títulos fundamentais da cinematografia europeia como "O Eclipse" (1962), de Michelangelo Antonioni, onde foi o materialista Piero ao lado da apaixonada Monica Vitti; ou na pele do volúvel e oportunista Tancredi em "O Leopardo" (1963) de Luchino Visconti.

Dirigido por Jean-Pierre Melville em "O Ofício de Matar" (1967), como um assassino inexpressivo e controlador, Delon cria uma das suas personagens mais marcantes, o solitário Jef Costello, num papel onde quase não fala.

Em 1969, o romance fora dos ecrãs reflete-se no erotismo de "A Piscina" onde contracena com Romy Schneider; e "O Clã dos Sicilianos", de Henri Verneuil faz Delon regressar aos papéis de fora-da-lei como parte de um grupo mafioso que planeia um audacioso roubo na companhia dos consagrados Jean Gabin e Lino Ventura.

Um ano depois, encontra Jean-Paul Belmondo no que viria a tornar-se um dos clássicos do cinema francês, "Borsalino", de Jacques Deray, sobre dois gangsters de Marselha que decidem trabalhar de forma independente.

Na década de 70, Delon garante mais dois trabalhos fundamentais da sua carreira. Em 1972, no trágico "Outono Escaldante", do italiano Valerio Zurlini, como Daniele, um professor de poesia com o vício do jogo que se apaixona por uma estudante; em 1976, no papel do negociante de arte sem escrúpulos que se vê confundido com um judeu na Paris ocupada pelos nazis, no brilhante "Mr. Klein - Um Homem na Sombra", de Joseph Losey.

Nascido a 8 de novembro de 1935 em Sceaux, no departamento de Hauts-de-Seine, Alain Delon teve uma infância marcada pela separação dos pais que o levou a lares de acolhimento. Aos 17 anos, juntou-se aos fuzileiros navais e esteve na Indochina francesa.

Três anos depois, regressa a Paris para uma vida à margem da legalidade. Conhece o ator Jean-Claude Brialy, que o leva ao Festival de Cinema de Cannes, onde a beleza de Delon atrai um caçador de talentos americano que lhe arranja um teste para o ecrã.

Estreia-se no cinema em 1957 no discreto "Quand la femme s'en mêle", de Yves Allégret.

O dom da controvérsia

Em 2019, o Festival de Cannes decide premiar Alain Delon com um Palma de Ouro honorária. NA altura, levantou-se um coro de protestos vindo dos Estados Unidos. Disse-se que era contra o casamento homossexual e misógino.

O delegado geral do Festival, Thierry Frémaux, defendeu a escolha dizendo que: "Não vamos atribuir o Prémio Nobel da Paz a Alain Delon, vamos atribuir-lhe a Palma de Ouro pela sua carreira de ator".

Na noite da entrega do prémio, o público no Palácio dos Festivais aplaude Delon de pé.

A verdade é que o ator nunca pareceu importar-se com o que pensavam dele. Não gostava do mundo atual, as suas declarações sobre mulheres pareciam tiradas dos anos 60 e 70, era amigo do fundador da Frente Nacional Jean-Marie Le Pen e apoiava abertamente a extrema-direita francesa.

Ao mesmo tempo, colecionava quadros e esculturas, relógios, vinhos e armas. Era um grande admirador de Charles de Gaulle e chegou a pagar do seu bolso a compra do manuscrito do apelo à resistência contra os nazis que o General leu ao microfone da BBC a 18 de junho de 1940. O documento foi depois oferecido à França.