Publicado em 2 May. 2025 às 17:49, por Pedro Sesinando, em Opinião, Notícias de cinema (Temas: O Espírito da Colmeia, Festivais de cinema)
Gia Coppola assina um drama protagonizado por Pamela Anderson onde a estética naturalista e a aura de redenção da protagonista não evitam que o filme tropece em clichês e escolhas narrativas que lhe reduzem o impacto emocional.
O mais recente trabalho de Gia Coppola, "The Last Showgirl", tinha, à partida, vários pontos que justificariam o entusiasmo à volta do filme.
Desde logo, a premissa nuclear da história, que segue Shelly, a bailarina em Las Vegas que vê o espectáculo a que se dedicou por mais de 30 anos, ser descontinuado e substituído por outro número mais conforme a lógica de mercado. Depois, o zeitgeist vigente no cinema norte-americano, especialmente o que balança entre o indie e o mainstream, parece propenso a acolher positivamente uma história entre os motifs de "The Florida Project" de Sean Baker e do mais recente, mas já consagrado, "A Substância", de Coralie Fargeat.
Finalmente, a presença de Pamela Anderson no papel da protagonista, induz, inevitavelmente, a ideia de que estaríamos perante a possibilidade de uma regeneração de carreira, mais do que um mero regresso, um desempenho capaz de nos levar a crer que teríamos sido privados de uma atriz com capacidade para mais do que lhe foi dado nos anos 90.
De facto, na estrutura estética, em particular nos planos interiores, deduz-se em Coppola a intenção de aplicar uma ideia naturalista para construir um bas-fond operário da Las Vegas que existe para lá do néon, fazendo-o de uma forma honesta, sem explorar gratuitamente o lado decadente, mas preferindo o anacronismo dos cenários, que se adivinham outrora sofisticados.
Talvez seja esta a única vitória de Gia (neta de Francis Ford Coppola), o sucesso na estrutura visual que edifica, mas que não tem complemento na construção da narrativa, nem nos diálogos por vezes demasiado teatrais para um cenário a gritar por realismo.
Na verdade, "The Last Showgirl" parece também perder-se no arco narrativo das personagens, em particular no de Shelly, que se vê sem modo de subsistência e limitada à opção de se expor a um mundo que não lhe perdoa ter envelhecido. Perante estas circunstâncias, estranha-se o permanente estado de ingenuidade em que vive a protagonista, ainda encantada com o mundo do espectáculo após tanto tempo de Las Vegas.
Coppola tem a intenção de fazer evoluir o filme através do impacto que a decisão de terminar o espectáculo provoca nas personagens, mantendo o foco nos afetados e omitindo os decisores.
Poder-se-ia concluir que esta opção encaminharia a narrativa por caminhos mais interessantes. Contudo, a uma história a trilhar os caminhos da consciência social, Coppola preferiu o melodrama, o que a levou a perder-se num labirinto de clichés.
O lugar-comum atinge o pico na cena em que Hannah, a filha que Shelly deixou ao cuidado de outra família para se poder dedicar ao ofício, confronta a mãe com as opções que tomou e com a infância a que a condenou.
Por entre os escombros resultantes de estas e outras escolhas preguiçosas, salva-se Jamie Lee Curtis no papel de Annette, fiel amiga de Shelly, que rouba o palco em todas as cenas em que entra. De tal forma que nos leva a questionar se o foco de Coppola não estará apontado à personagem errada.
"The Last Showgirl" foi exibido no IndieLisboa 2025. Não há notícia de que venha a ter estreia comercial nas salas portuguesas.