Publicado em 19 Jul. 2022 às 14:23, por Pedro Sesinando, em Opinião, Notícias de cinema (Temas: O Espírito da Colmeia)
Filme de encerramento do Curtas de Vila do Conde, após ter passado por Cannes, "Fogo-Fátuo" é a primeira visita do cineasta português ao domínio da comédia.
Nas palavras do próprio João Pedro Rodrigues, "Fogo Fátuo" é a materialização do desejo do realizador lisboeta de experimentar a comédia.
Estreado em solo nacional na sessão de encerramento do Curtas de Vila do Conde, após passagem por Cannes, "Fogo Fátuo" começa por vaguear pelas memórias de um rei moribundo, velado em vida por um infante de nome Sancho e uma ama zelosa.
Num tom que César Monteiro não desdenharia, passamos para as reminiscências do então príncipe e de como, em singulares jantares de família, encontra o desígnio de tornar-se bombeiro e salvar um Portugal literalmente em chamas.
É no quartel que o príncipe sem trono imerge num processo despertativo não só sexual, mas também de consciência, quando confrontado com o passado colonial português.
Todos estes temas são abordados por João Pedro Rodrigues de uma forma subtil, mas incisiva, sarcástica dir-se-ia, e com um sentido cómico e de teatralidade certeiros. Para tal contribuem os planos longos ajudados por uma fotografia muito bem trabalhada, construindo uma sucessão de telas em movimento que tornam o filme numa sequência rítmica de gags bem conseguidos, intercalados por momentos musicais que ajudam ao avanço da narrativa.
"Fogo Fátuo" tem um ethos de desconstrução do género comédia, um impulso provocatório latente, pontuado por referências históricas e populares que resulta com o tom despretensioso do filme.
O elenco, em particular os protagonistas, Mauro Costa e André Cabral, conseguem uma harmonia em cena decisiva para que o filme resulte tão bem, e a presença sempre cinematográfica de Paulo Bragança, já merecia uma cena como a que lhe foi dada em "Fogo Fátuo".