Publicado em 15 Jul. 2024 às 08:45, por Pedro Sesinando, em Opinião, Notícias de cinema (Temas: O Espírito da Colmeia, Festivais de cinema)
O realizador de "Ice Merchants" abriu o festival com uma sessão-concerto e "iNTELLIGENCE" de Jeanne Frenker e Cosme Castro destacou-se entre as propostas da competição internacional.
Após uma sessão de abertura que contou com a presença de João Gonzalez, realizador de "Ice Merchants", a musicar ao vivo o seu reportório de curtas-metragens, a edição 2024 do Curtas de Vila do Conde entrou este sábado pela Competição Internacional de Curtas, com uma sessão tão forte como variada. Desde logo com a curta de produção nacional, "Três Vírgula Catorze", de Patrícia Rodrigues e Joana Nogueira, um trabalho de animação em stop-motion em que as autoras propõem uma viagem pelo universo interior de crianças diagnosticadas com Perturbação de Hiperatividade e Défice de atenção. Para lá do excelente trabalho de animação, destaca-se a música original composta por Nico Tricot, que acompanha as deambulações criativas das crianças, conferindo à obra uma mecânica infantil, mas desarrumada, quase lúdica, uma semiótica perfeita quando falamos de crianças que vivem num tom próprio e procuram, ao mesmo tempo, entender o seu lugar no mundo.
De França chega "Les Animaux vont mieux", de Nathan Ghali, e "iNTELLIGENCE" da dupla Jeanne Frenkel e Cosme Castro. Se o primeiro se perde numa animação hiper-realista que, paradoxalmente, contribui para o tornar menos credível, o segundo, protagonizado pelo consagrado Vicent Macaigne, é o grande filme desta sessão.
Assente num ambiente estético que mistura o sci-fi distópico e o retrofuturista, o filme de Frenkel e Castro apresenta a história de Pascal Riviére, jornalista que lê sobre a sua própria morte no jornal onde trabalha e decide contactar uma empresa que lhe garanta a criação de um fantasma a partir das suas memórias.
Delicado e visualmente deslumbrante, "iNTELLIGENCE" apoia-se no seu protagonista, um ser apagado, cultor da própria irrelevância, para construir um ensaio não só sobre o medo à solidão e ao arrependimento, mas, acima de tudo, se é que não anda tudo ligado, sobre a humana condição de temermos a insignificância e as armadilhas que esse temor nos faz montar pelo caminho.
Destaque final para o filme de Éric K. Boulianne, "Faire un enfant", drama em que o cineasta canadiano sugere condensar as peripécias, frustrações e dúvidas que surgem na vida de um casal que está no processo de tentar engravidar.
A Boulianne há que dar o mérito de, não só, conseguir colocar-nos ferozmente do lado daquelas pessoas, enquanto casal e indivíduos, mas também na forma como salta harmoniosamente entre géneros, não permitindo que a comédia e o drama se façam por meio de apontamentos, fazendo-os evoluir de forma natural pela erosão das personagens. Até lhe perdoamos a previsibilidade do final.